Draco apura expulsão de moradores pela milícia
RIO, 30 setembro 2012 -
Beneficiado por um reassentamento, fruto de uma parceria da Secretaria
municipal de Habitação com o programa “Minha casa, minha vida”, da Caixa
Econômica Federal, o servente X., de 39 anos, deixou um barraco em uma
comunidade carente da Zona Oeste do Rio e mudou-se, em julho deste ano, para um
apartamento, num dos condomínios da comunidade dos Jesuístas, em Santa Cruz,
Zona Oeste do Rio.
A alegria com a nova casa
durou muito pouco. Foi destruída pela milícia. Uma noite, ao chegar do
trabalho, X. encontrou quatro pessoas armadas de pistolas dentro de sua
residência. Em seguida, recebeu um recado dos milicianos, chefiados pelo
ex-policial militar Toni Ângelo Souza de Aguiar, o Toni.
— Mandaram eu meter o pé. Disseram
que, se ficasse no apartamento, iria morrer. Saí só com a roupa do corpo. Tive
que abandonar geladeira, televisão, fogão e todos os meus pertences lá —
explica o servente.
A experiência vivida por X.
não é um fato isolado. Pelo menos outras sete familias também foram expulsas de
apartamentos dos condomínios Aveiro, Almada e Coimbra, localizados quase lado a
lado na Estrada dos Jesuítas, onde moram 1.343 famílias. Todas vieram de
comunidades carentes do Rio e foram reassentadas nos três conjuntos, inaugurados
em maio deste ano.
Segundo relatos das vítimas
ouvidas pelo EXTRA, que procuraram a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia
Legislativa do Rio, os motivos para a expulsão coletiva variam, e vão desde de
ter um parente usuário de drogas, ou acusado de algum crime, até desobedecer as
regras impostas pelos milicianos, como a proibição de chegar em casa após as
22h.
Além de controlar a venda de
botijões de gás e a exploração do serviço de mototáxi, a milícia que atua no
conjunto habitacional da Estrada dos Palmares também vende cestas básicas para
os moradores. Segundo a dona de casa Z., de 36 anos, a venda é feita por uma
mulher que trabalha para o bando de Toni Ângelo. Cada cesta é comercializada
por R$180.
O pagamento pela cesta, que
inclui alimentos como café, arroz, feijão, açucar e um kit de material de
limpeza, tem de ser feito em, no máximo, 30 dias.
— A gente só pode comprar na
mão deles. No fim dos 30 dias, eles mandam recolher o dinheiro. Comprei uma vez
só e fiquei desesperada. Até o culto eles controlam. Se a oração estiver alta,
os milicianos vão lá e dizem que Deus não é surdo, que tem de parar com aquilo
— afirma Z., que morou por dois meses num apartamento de um dos condomínios. —
Agora, estou morando de aluguel numa outra comunidade. Pago R$ 350, mas é
melhor do que correr o risco de ser morta lá. E tenho de usar o dinheiro que
recebo do Bolsa Família para pagar o aluguel.
A Secretaria de Segurança
confirmou que a Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco) está
investigando a expulsão de moradores dos três condomínios da comunidade dos
Jesuítas. Os policiais também apuram a informação de que dois ex-moradores da
Cidade de Deus foram capturados pelos milicianos e assassinados, em junho. As
vítimas teriam sido mortas por serem usuárias de drogas.
A Secretaria de Segurança
informou que já ouviu algumas vítimas. O delegado Alexandre Capote, da Draco,
pediu que outras denunciem o caso a polícia:
— Todos os moradores que foram
obrigados a deixar seus imóveis devem procurar a Draco. Garantimos o anonimato
dos depoimentos e das identidades das testemunhas. O silêncio é o maior
cúmplice dos criminosos.
Procurada, a Prefeitura do Rio
afirmou que está à disposição da Secretaria de Segurança para colaborar no que
for preciso. Já a Caixa Econômica Federal informou que as questões ocorridas
nos condomínios são de segurança pública. Segundo a Caixa, nos casos de
comprovada irregularidade na ocupação do imóvel — por exemplo, utilização por
não-beneficiários do contrato — a desocupação do apartamento é solicitada à
Justiça Federal e uma denúncia é encaminhada à Polícia Federal.
Fonte O Globo.
Foto: O Globo
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