domingo, 27 de maio de 2007

RIO DE JANEIRO A MERCÊ DO CRIME


O GOVERNO SABIA



Antônio Werneck


Há pelo menos dois anos, a Secretaria de Segurança sabia que um grupo de policiais civis — segundo a Polícia Federal chefiados pelo delegado e deputado estadual eleito Álvaro Lins (PMDB) — cobrava propinas e vendia proteção aos contraventores Rogério Andrade e Fernando Iggnácio.

Relatórios mostrando negócios e a evolução patrimonial de policiais, inclusive citando Lins, na época chefe de Polícia Civil, como cabeça do grupo, foram entregues pela Subsecretaria de Inteligência (SSI) ao delegado Marcelo Itagiba, então secretário de Segurança. Como as investigações não andaram, um dossiê com todas as informações foi enviado à PF, dando início à Operação Gladiador, desencadeada na última sexta-feira.

O GLOBO teve acesso a parte das informações que ainda se encontram nos arquivos da SSI. Elas mostram que Lins foi investigado, aparecendo nos relatórios como um dos supostamente envolvidos na máfia dos caça-níqueis. Lins tem negado categoricamente qualquer envolvimento no caso. Os documentos apontam ainda uma suposta ligação com pelo menos um empresário de Barra Mansa suspeito de envolvimento com a máfia dos combustíveis.

Ao comentar ontem as acusações contra Lins, a governadora Rosinha Garotinho foi lacônica: — A Polícia Federal diz que tem provas, mas a própria Justiça federal diz que não há provas contra ele — disse Rosinha, referindo-se ao fato de a Justiça não ter aceitado o pedido de prisão contra o delegado.

Nomes estavam na agenda de bicheiro Nos relatórios da SSI, há os nomes de vários policiais civis e militares supostamente envolvidos com a máfia do combustível, como os inspetores Fábio Menezes de Leão, o Fabinho (preso na Operação Gladiador); Hélio Machado da Conceição, o Helinho; e Jorge Luís Fernandes, o Jorginho. Os dois últimos também tiveram a prisão decretada, mas estão foragidos. Num dos relatórios, os agentes da SSI lembram a evolução patrimonial que os três policiais tiveram nos últimos anos, depois do envolvimento deles na proteção dos bicheiros Rogério Andrade e Fernando Iggnácio.

Os agentes constataram que quase todos os policiais civis supostamente ligados à máfia dos caça-níqueis estavam na agenda do contraventor Waldemir Paes Garcia, o Maninho, assassinado em setembro de 2004, em Jacarepaguá.

Fontes consultadas pelo GLOBO não sabem dizer por que, sendo investigado, Lins não foi afastado do cargo de chefe de Polícia Civil. Itagiba, agora deputado federal eleito, foi procurado pelo GLOBO, mas não retornou as ligações. Já a Secretaria de Segurança informou que várias investigações e operações contra a máfia dos caça-níqueis foram realizadas tanto na gestão de Itagiba, como na atual, de Roberto Precioso.

Um dossiê do setor de inteligência, com nomes, endereços e toda a vida financeira dos envolvidos, foi enviado em 2004 à PF, que na época estava investigando as atividades do exagente federal, que fora lotado na superintendência do Rio, Paulo Cezar Ferreira dos Nascimento, o Paulo Padilha.

Ele foi preso em setembro deste ano, em Búzios, pela Polícia Civil, após ameaçar de morte um agente federal. Padilha ficara revoltado porque a PF lhe negara um pedido de porte de arma, com base num relatório do agente federal.

Ontem, o corregedor da Polícia Civil, delegado Ricardo Martins, disse que, em julho deste ano, foi avisado pelo Ministério Público federal sobre a investigação que resultou na Operação Gladiador. Segundo o delegado, o MP pediu informações.

— Quando recebemos as denúncias do Ministério Público federal, abrimos uma sindicância administrativa disciplinar, mas não conseguimos andar com as investigações.

Acho que a Polícia Federal obteve melhores meios para apurar o caso — disse o corregedor.

Ele informou ainda que está pedindo cópias do inquérito da PF e que só a partir da análise do material Álvaro Lins será investigado.

— É leviano falar sem ter provas contundentes. Na nossa sindicância, chegamos a ouvir várias pessoas — comentou o delegado, sem lembrar quantas e quais pessoas foram ouvidas.

Ao ser perguntado se estava constrangido por investigar seu exchefe, Martins disse que a corregedoria é independente.

Também acusado de envolvimento com a máfia dos caça-níqueis, o coronel Celso Nogueira, ex-comandante do 14oBPM (Bangu), continua preso no Batalhão de Choque da Polícia Militar.


Fonte: O Globo, pag. 12 de 19/12/2006.

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