sábado, 7 de maio de 2011

Milícia pode matar testemunha morador de rua a qualquer momento

Ameaçada de morte, testemunha que acusou PM de matar morador de rua está sem proteção


RIO – Morador de rua há três anos, o adolescente W. estava sob o Viaduto Negrão de Lima, em Madureira, quando foi abordado por um homem “de nome Castelo” que lhe ofereceu R$ 200 para atrair Janderson Martins dos Santos, o Funga, ao terreno da Comlurb. Eram 13h15m de 24 de abril do ano passado, e o rapaz, que sobrevivia de esmolas e da venda de biscoitos, não aceitou a oferta por saber que levaria o companheiro de rua à morte. A recusa de W. não evitou a execução de Funga, mas seu testemunho à Divisão de Homicídios (DH) levou à prisão o policial Jussieu Castelo Júnior, integrante da milícia chefiada pelo sargento PM Marcos Vieira de Souza, o Falcon.

Foi o depoimento de W. que os policiais da Delegacia de Repressão a Ações Criminosas Organizadas (Draco) encontraram ao prender o sargento Falcon e três outros homens acusados de porte ilegal de armas e envolvimento num grupo paramilitar, no último dia 14. O documento, vazado por um inspetor da DH, estava no interior da Pajero blindada do PM. No relato de duas páginas, W. detalha os momentos que antecederam o assassinato de Funga e acusa Castelo de receber dinheiro de comerciantes em nome de Falcon. Apesar dos indícios de que o bando pretendia encontrar e eliminar a testemunha a partir das informações, W. não recebeu nenhuma proteção oficial.

A inclusão do nome de W. no Programa de Proteção à Testemunha deveria ter sido solicitada ao Ministério Público estadual. O que não foi feito até a última sexta-feira, segundo o promotor Homero das Neves, que tem atribuição de acompanhar inquéritos em andamento na Divisão de Homicídios (DH) e na Corregedoria da Polícia Civil, onde foi instaurada investigação para apurar responsabilidades no vazamento do depoimento prestado pelo adolescente. Um inspetor já foi identificado como responsável pela irregularidade, mas, segundo a assessoria da Polícia Civil, o pedido de inclusão do jovem no programa de proteção deveria ter sido feito pela Draco, que informou que o caso está sendo apurado pela Corregedoria da PM, que não se pronunciou.

Em meio ao jogo de empurra, W. permanece sem receber proteção. No depoimento à DH, o adolescente contou que, após recusar os R$ 200, Castelo fez a mesma oferta a outro morador de rua. Dependente de crack, Osvaldo Felipe Lima Ribeiro também vivia nos arredores do viaduto de Madureira e aceitou ajudar na emboscada. Funga foi chamado por Osvaldo para fumar crack no terreno da Comlurb e lá, segundo o adolescente, foi morto a tiros por Castelo.

Em março passado, quase um ano após o assassinato, os dois acusados tiveram as prisões decretadas. Dias depois, o inspetor da DH teria impresso a cópia do depoimento de W. que foi apreendida no carro de Falcon. Única testemunha do crime, o adolescente foi peça fundamental na investigação e sua morte fatalmente resultaria no relaxamento da prisão do PM Castelo, livrando ainda Falcon de possíveis desdobramentos da investigação para apurar a cobrança de “taxa de segurança” dos comerciantes. No depoimento, W. diz que o sargento Falcon controla a segurança do comércio nos bairros de Cascadura a Marechal Hermes.


Fonte: O Globo

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